A contagem regressiva para os Jogos Olímpicos de Paris está chegando perto de um ano e, apesar de mais de 20 atletas brasileiros já terem carimbado seus passaportes rumo à França, ainda há muita água para rolar até 26 de julho de 2024, literalmente. Uma novidade de esporte aquático desta edição traz um potencial inédito de classificação para o Brasil: o Kitesurf. Essa expectativa recai principalmente sobre o número um do kite brasileiro, o maranhense Bruno Lobo.
Aos 29 anos, o atleta já se tornou a principal referência do esporte não só no País como em todo o continente. Bicampeão das Américas, hexacampeão brasileiro e octacampeão maranhense são alguns dos títulos em seu currículo dourado. Carregando a torcida nordestina consigo, Bruno conversou com o UrbNews sobre sua trajetória e o sonho olímpico de infância.
O kitesurfe surgiu no seu caminho do maranhense como uma brincadeira, ainda em 2010. Então com seus 17 anos, o maranhense à essa altura da vida já havia sido nadador e triatleta, com passagens até pela delegação brasileira, quando então seu pai o apresentou ao lazer da prancha e da pipa.
“Acabei vendo que eu levava jeito no esporte. Vi algumas competições locais no Maranhão e comecei a participar. Tive um resultado bom logo nos primeiros meses e fui treinando mais e participei de um campeonato brasileiro em São Luís, que tinha outros atletas de fora. A partir daí eu comecei a investir no equipamento também e a pensar em competir a nível nacional”, relembra.
A partir de então, Bruno se tornou quase que um precursor do esporte em São Luís, desbravando a modalidade de regatas do Kite.“Primeiro ano já fiquei ali entre os dez primeiros, dois anos depois já fui vice campeão brasileiro e, em 2015, consegui meu primeiro título nacional. Graças a Deus desde então tenho me mantido no topo. E acabei também desbravando, competindo internacionalmente”, conta.
Além do desafio de treinar sozinho, teve que conciliar a prática esportiva com os estudos. Bruno Lobo, além de atleta, é formado em Medicina. Ele se dedicava aos treinos de kitesurf em paralelo à graduação, concluída em 2017, e ainda às especializações em ortopedia e cirurgia do joelho, conhecimento que pode ser bem útil quando se fala em esportes de alto rendimento.
Bruno é muito atuante em suas redes sociais com conteúdo informativo sobre articulações, lesões e cuidados ortopédicos em geral para seus mais de 10 mil seguidores no Instagram. Apesar de ter conciliado com sucesso as duas áreas nos últimos anos, hoje ele se diz mais focado no esporte, especialmente em razão de seu sonho de chegar aos Jogos Olímpicos de Paris 2024.
Velejando atrás do sonho olímpico
O sonho olímpico da infância de Bruno foi interrompido quando lesões o tiraram da natação e do triatlo competitivos, mas foi resgatado com o Kitesurf. “Sempre sonhei em ser atleta, antes mesmo de ser médico. Todo mundo que me conhece, minha família sabe que eu sempre quis ir à Olimpíada, não sabia em qual esporte eu ia, mas tinha essa vontade”, diz.
Na busca pela classificação do Brasil para os Jogos, Bruno conta que 2023 é um ano que “está todo mundo correndo atrás desse objetivo, todos os países estão incentivando as equipes, dando seu máximo nessa reta final para poder conseguir essas vagas”. A primeira seletiva será no Mundial de Vela em agosto, na Holanda, onde estarão em jogo nove das 20 vagas para países no Kitesurf olímpico.
A segunda oportunidade será nos Jogos Pan-Americanos, que acontecem de 20 de outubro a 5 de novembro, no Chile. Já classificado para o Pan, Bruno não só busca o ouro como também a vaga olímpica sul-americana em disputa. Conquistar o Pan não seria um feito inédito na carreira de Bruno Lobo, que em 2019 foi ouro no Kitesurf em Lima, no Peru. “Vi a bandeira do Brasil no lugar mais alto do pódio”, lembra com orgulho.
O ouro pan-americano veio na modalidade Formula Kite, que estará no quadro dos Jogos Olímpicos agora pela primeira vez em Paris 2024. “É um sonho que está ao mesmo tempo muito perto mas tem muita coisa pra acontecer, muito trabalho pela frente. Mas a gente tem fé em Deus, entrega na mão dele, e vamos dar o nosso melhor com certeza pra chegar lá e brigar por uma medalha”, espera o atleta.
Passagens pela Terra do Vento
Para chegar ao sonho olímpico, Bruno teve que intensificar seus treinamentos diários. O que antes era um turno de treino dentro d’água, se tornaram dois. “Eu procuro estar todo dia na água, se as condições permitirem. É claro que tem dias que isso não é possível, mas aqui no Nordeste a gente tem condições boas para velejar quase o ano todo”.
E falando no Nordeste, Bruno teve importantes passagens por Fortaleza, que nos últimos dois anos recebeu etapas da Copa Brasil de Vela de Praia. O atleta foi o grande campeão da categoria Formula Kite na edição de 2022, realizada no Iate Clube. O maranhense venceu todas as 10 regatas da classe nas águas da capital cearense. Neste ano, a III Copa Brasil de Vela de Praia – Etapa Fortaleza acontecerá de 16 a 21 de agosto.
“O Ceará é a terra do vento, onde o ventilador está ligado todo o tempo [risos]. A geografia permite a maior incidência do vento, e o litoral do Ceará é um litoral maravilhoso, que atrai pessoas de todo o Brasil e do mundo. Tem a Rota das Emoções, entre o Ceará e o Maranhão, que acho que é a parte mais abençoada para as condições do kite”, avalia o campeão.
Bruno comenta ainda que o Cumbuco, muito conhecido por atrair inúmeros atletas e campeonatos do esporte às águas da Caucaia, é um berço do Kitesurf. Em setembro de 2020, a Praia do Cumbuco bateu o próprio recorde mundial de kitesurfistas velejando ao mesmo tempo: a comissão julgadora do Guinness World Records 2022 contabilizou 884 atletas desafiando as ondas simultaneamente. Em 2019, o recorde era de 596 velejadores.
“Vários atletas surgiram lá na modalidade freestyle, como o Mário Bebê e tantos outros. Muitos atletas também tradicionais em outros países vão pro Brasil pra treinar no Cumbuco, é um lugar que tem uma condição muito boa para a prática do kite, principalmente do kite de freestyle, que são as manobras, e o pessoal do Ceará arrebenta”, Bruno completa.
Abrindo caminho para as novas gerações
Para quem tem interesse em começar no esporte, Bruno fala que é sobre gostar de estar no mar, da sensação de ter o kite deslizando sobre a água, sendo levado pelo vento. Além da identificação com a água, é importante ter algum tipo de acompanhamento para começar na prática. “O que eu sugiro é pegar equipamento usado, alguém experiente que ajude e tudo fica mais fácil”, recomenda.
Bruno avalia que é crescente o número de praticantes de Kitesurf, e que esse fenômeno pode ter um aumento ainda maior com a entrada do esporte — e se tudo der certo, do Brasil — na Olimpíada. Com isso surgiriam não só novos atletas, mas também mais apoio e patrocínio para os que já estão nas águas.
“Eu acho que o Brasil tem muito potencial. Eu estou sendo um dos precursores, mas a gente está realmente plantando sementes e esperando que nesses próximos jogos venham mais atletas. O Brasil com certeza tem condições perfeitas para ter grandes campeões nos próximos anos”, finaliza.