A Lei Maria da Penha completa 17 anos nesta segunda-feira (7). Em 2006, a luta de uma farmacêutica cearense agredida pela marido inspirou a criação da legislação pioneira que estabeleceu medidas de proteção para as mulheres vítimas de violência e agravou as punições aos agressores.
A norma exemplar inspirou não só medidas semelhantes ao redor do mundo, como é a força motivadora por trás do Agosto Lilás, movimento nacional que dedica o oitavo mês do ano a campanhas e ações de conscientização pelo fim da violência contra a mulher.
Também há 17 anos, o artista cearense Tião Simpatia, inspirado pela então nova lei, escreveu um cordel explicando a norma em termos simples e de fácil compreensão. A ideia surgiu ao conhecer Paulinha Castro, então assessora de Maria da Penha, a mulher que inspirara a lei.
Além da música surgiu também uma amizade e uma nova rotina: a de cantar sobre o tema para levar a informação e a conscientização sobre a violência contra as mulheres a todo o país. Segundo ele, essa foi a maneira que encontrou para dar sua contribuição como artista e como cidadão que se incomoda com esse tipo de desrespeito.
“É a nossa contribuição enquanto artista, cidadão que se incomoda, que não aceita que uma mulher seja violentada, seja maltratada, e que usa a sua voz e sua arte para dar visibilidade a essa causa. Agora mais feliz ainda, porque essa voz que a gente começou lá no início da criação da lei está se multiplicando por outras pessoas, por crianças, por adolescentes decorando cordel, nos mandando vídeos quase que diariamente nas escolas. A gente também vai às escolas e aí forma esse grito coletivo de não violência contra mulher”, disse.
Tião conta que o encontro com Maria da Penha fez com que ele, que apesar de não ter sido criado em ambiente de abusos mas ter hábitos machistas, passasse a entender o efeito desses hábitos e mudasse a forma de agir, procurando entender a mulher no contexto em que está inserida, ou seja político, social, econômico, histórico e educacional.
“Mudei radicalmente no sentido do respeito e de não reproduzir estereótipos. Passei a focar minha criação literária e musical no respeito à mulher e na divulgação da lei. Isso me transformou em um artista melhor, mais consciente, um cidadão melhor, que tenta evoluir todos os dias e influenciar outras pessoas”.
E ele conseguiu. Samy Abreu é uma de suas fãs e aos 8 anos sabia o cordel de cor e salteado. Hoje com 13, ela conta que conhece diversas histórias de abuso contra as mulheres e tem orgulho do sucesso que fez ao recitar o cordel ainda criança e saber que milhares de pessoas entenderam a mensagem passada.
“No facebook, tive mais de 12 milhões de visualizações. Então são 12 milhões de pessoas alcançadas e que ficam por dentro da lei de maneira descontraída, que é a forma do Cordel e que alerta homens e as outras pessoas em geral para não cometerem os erros que muitos abusadores e pessoas violentas vêm praticando na sociedade”, ressaltou.
Samy tem uma carreira consolidada na arte focada em temas sociais, com base em parcerias feitas para atuar em prol da sociedade e levar bem-estar às pessoas. “Com o tempo, fui me adaptando a muitas coisas e fomos fazendo parcerias. Então, consegui conciliar a carreira de maneira didática por meio da literatura de Cordel. Fico muito feliz em poder influenciar pessoas por meio de minha arte, da literatura de cordel, que tanto louvo, principalmente sobre algo tão sério”, afirmou Samy.
Referência no judiciário
Em 2019, um trecho de A Lei Maria da Penha em Cordel, de Tião Simpatia, foi citado pelo juiz paranaense Marcelo Quintin durante o julgamento de uma ação no qual o marido queria indenização e medida protetiva contra a esposa. Quintin usou o trecho para embasar sua sentença, na qual negou a aplicação da Lei Maria da Penha.
“Apesar de ser uma peça artística e cultural do Brasil, o Cordel trata de forma detalhada e traz informações jurídicas. E aí eu pensei que poderia levar aquela mensagem de forma mais fácil pro jurisdicionado. Eu citei o trecho que trata de o homem não poder ser escorrido pela Lei Maria da Penha e aí a gente explica que há a proteção de determinado segmento da sociedade por ter isonomia, de se agir de forma desigual para trazer a verdadeira equidade”, explicou o juiz.
Quintin contou que na época em que preferiu a decisão citando cordel, recebeu muitas críticas de homens que o questionavam sobre a não existência de leis que os protejam em situações de violência doméstica. Segundo ele, é necessário lembrar que o homem tem proteção na legislação comum, do Código Penal e de outras leis que já existem. “Mas por conta dessa desigualdade fática que enfrentamos diariamente de mulheres vítimas todos os dias, temos uma lei específica e protetiva desse segmento social.
Com informações da Agência Brasil.