O Conselho Federal de Medicina (CFM) apresentou, na última semana, uma série de atualizações nas regras sobre publicidades feitas por médicos do Brasil. A nova resolução traz algumas mudanças em relação a anterior, de 2011. A norma entra em vigor em 180 dias e todo o processo demorou mais de três anos.
Agora, médicos de clínicas de todo o país poderão continuar publicando imagens de “antes e depois” de tratamentos — inclusive estéticos — desde que com o consentimento do paciente. Ainda assim, as imagens devem conter caráter educativo e obedecer alguns critérios.
O primeiro é que o material deve estar relacionado à especialidade registrada do médico e a foto deve vir acompanhada de texto educativo, contendo as indicações terapêuticas e fatores que possam influenciar negativamente o resultado.
A imagem também não pode ser manipulada ou melhorada e o paciente não pode ser identificado. Demonstrações de antes e depois devem ser apresentadas em conjunto com imagens contendo indicações, evoluções satisfatórias, insatisfatórias e possíveis complicações decorrentes da intervenção.
Foram três anos de estudo e a consulta pública para a criação da resolução recebeu mais de 2.600 sugestões de profissionais e associações médicas do país. Segundo o CFM, as clínicas terão até o dia 11 de março de 2024 para se adaptar às novas regras. Depois da data, ela passa a ser obrigatória.
Avaliação de quem é do ramo
Embora enxergue “muitos pontos positivos” na nova resolução, a médica dermatologista Mariana Pimenta, proprietária de uma clínica em Fortaleza, afirma que outros aspectos são duvidosos e podem gerar confusão entre os consumidores.
“Na minha clínica nós teremos poucas mudanças, já que eu não tenho a intenção de divulgar muitos antes e depois de pacientes. Porque além de expor o paciente nós podemos criar uma expectativa falsa, porque a gente sabe que na estética os resultados dependem de cada paciente, cada particularidade anatômica de idade, de estilo de vida, então não é uma ciência exata”, diz.
Apesar disso, ela comenta que a possibilidade de divulgar o trabalho com maior liberdade “é maravilhosa”. “Com maior igualdade de competir com outras profissões e com a opção de que o paciente possa ou não autorizar a divulgação da imagem. Isso é muito importante para que ele não se exponha de uma forma que incomode a ele ou alguém da família”, pontua.
Outra novidade presente na nova resolução é a autorização para que médicos divulguem os preços de consultas e promoções. Para a dermatologista, é importante que o paciente saiba dos preços para evitar “surpresas”.
“Ele pode se informar pelas redes, antes de comparecer a clínica para que não cause nenhum constrangimento e acho que isso deve ser usado de uma forma muito ética para que o código de ética médica continue sendo super válido e respeitado”, diz Mariana.
A Lei Geral de Proteção de Dados entra na história
O advogado David Accioly de Carvalho, consultor em Proteção de Dados Pessoais com atuação em Fortaleza, avalia que, para além da confiança na capacidade técnica, a relação médico-paciente será cada vez mais pautada na confiança ética.
Segundo ele, sob o ponto de vista de mercado, a resolução parece mais “sóbria e condizente com as características daquilo que se convencionou chamar de sociedade da informação que, impulsionada pelo avanço tecnológico, coloca informação e o conhecimento como elementos centrais da produção econômica”.
Para ele, a resolução atende aos anseios do mercado de saúde por liberar novas práticas de publicidade e propaganda médicas. “Contudo, as novas práticas permitidas exigem maior maturidade ética dos profissionais e maior controle da conformidade de suas atividades, pois a privacidade dos pacientes, sem sombra de dúvidas, prevalecerá em qualquer conflito que venha a se estabelecer”, afirma.
David Accioly destaca ainda que, de acordo com a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), a imagem dos pacientes, no contexto da nova resolução, é considerada um dado pessoal sensível. Por isso, seu tratamento sofre restrições e requer a adoção de uma série de medidas de governança e de segurança da informação.
“Se não forem observadas, podem provocar responsabilidade civil (indenizações) e administrativa (multas e outras penalidades) dos profissionais, valendo destacar que a autarquia responsável pela regulamentação e fiscalização da LGPD, no caso, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados já iniciou sua agenda de fiscalização e, todos os dias, temos notícias de autuações decorrentes do descumprimento legal”, alerta.
Ele sugere a todos os profissionais da área médica implantarem um programa de privacidade e proteção de dados pessoais, mantendo evidências da adequação de suas atividades, tanto em relação à nova resolução do CFM, como à LGPD e outras normas correlatas. “Importante, também, implementar um programa de integridade, para o acompanhamento das questões éticas”, finaliza.