Pode abrir o sorriso e preparar o coração, porque junho chegou com tudo na capital cearense! E, para começar com o pé direito, Fortaleza deu um passo importante na preservação de suas raízes culturais: a cidade oficializou as quadrilhas juninas como Patrimônio Cultural Imaterial.
A novidade foi anunciada pela Secretaria Municipal da Cultura (Secultfor), que reconheceu oficialmente a importância dessas manifestações tradicionais, que enchem as ruas de cores, música e alegria nesta época do ano. E, falando em tradição, a quadrilha Zé Testinha ganha destaque. Uma das mais aguardadas do mês de junho há 49 anos, ela encanta moradores e visitantes, mas, acima de tudo, atravessa gerações com sua história de amor às raízes do São João.
É no meio do laço de fita, do vestido de chita, do chapéu de palha e do teatral do cangaço que essa história é contada todos os anos. Para Reginaldo Rogério, um dos fundadores da Zé Testinha, isso é mais do que um legado: é a obrigação de zelar pela tradição da festa nos dias de hoje, de geração em geração.
“Desde os 14 anos, eu já fazia parte do mundo dos festejos juninos. A Zé Testinha nasceu da paixão de vários amigos, que usavam a quadrilha como um momento de descontração e encontro”, conta Reginaldo. Além dele, a filha Ivna Rogério explica que a quadrilha sempre foi uma extensão da sua vida: “Nascemos dentro do movimento junino, né? A Julie [filha de Ivna e neta de Reginaldo] também já veio nessa sequência, sempre participando, mesmo que de forma pequena, até atingir a idade para entrar na infantil. Sempre tentei estar presente, mesmo que de longe, porque para a gente o movimento junino é o que move a nossa história.”
Ivna reforça ainda a importância de manter viva essa tradição: “A nossa vida gira em torno do movimento junino. Tem outras festas, outros eventos, mas o São João é o que realmente nos faz sentir vivos. Recentemente, passei por uma perda muito difícil, a perda de um neném, e o movimento junino foi o que me tirou daquele lugar, que me trouxe de volta a vontade de sorrir, de estar feliz novamente. Além da representatividade cultural, há também uma questão terapêutica nisso tudo.”
Reginaldo aponta a importância do vínculo familiar na história da Zé Testinha: “A nossa família, é a família que eu digo é eu, meu irmão e mais quatro irmãs. A gente é muito unida. Por exemplo, a forma com que meu pai educou e minha mãe educou a gente, é, o filho do meu meu irmão é mesmo que ser um filho meu, entendeu? (…) por exemplo, o noivo da quadrilha, ele é mesmo que ser um filho meu, o marcador é mesmo que ser um filho meu, entendeu? São sobrinhos, mas a gente tem como a gente vivencia o mundo deles também”, diz.
Mas afinal, o que difere a Zé Testinha das demais quadrilhas cearenses? Para Reginaldo, a resposta é clara: “Ela não é uma quadrilha comum, ela é uma quadrilha de família. É uma família com outras famílias, né?”.
Tradição e patrimônio
Para os brincantes da Zé Testinha, quando perguntados, a quadrilha junina representa diversos sentimentos: refúgio, tradição e resistência. Como um sentimento coletivo, a história por trás de várias outras quadrilhas juninas espalhadas pelo estado ganham destaque e valorização a cada ano.
Neste ano de 2025, a valorização chegou em maio, quando a manifestação ganhou o título de Patrimônio Imaterial Cultural de Fortaleza, fazendo da capital a primeira cidade a reconhecer a relevância da manifestação para a identidade, cultura e memória do povo fortalezense. O fato foi oficializado no Livro de Registro das Formas de Expressão.
A secretária da Cultura, Helena Barbosa, destacou que a valorização do patrimônio de Fortaleza tem sido uma questão prioritária da pasta. “Esse é mais um avanço que reafirma o compromisso da gestão com a preservação da memória e das tradições que constituem a identidade cultural de Fortaleza”, disse.
Manifestação de cultura nacional
Essa não é a primeira vez que as quadrilhas juninas recebem o devido reconhecimento cultural. Em 2024, no Dia de São João, a dança foi reconhecida como manifestação da cultura nacional. A Lei Nº 14.900/2024 tornou oficial a decisão. A medida foi assinada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e pela ministra da Cultura, Margareth Menezes, e posteriormente publicada no Diário Oficial da União (DOU).
Com a sanção presidencial, o estilo de dança passa a integrar o grupo que inclui também as escolas de samba, o forró e as festas juninas. “O reconhecimento contribui para o fortalecimento da nossa identidade cultural, além de valorizar essa dança tradicional presente nas festas juninas promovidas no país”, comentou a ministra Margareth Menezes.
O diretor de Promoção das Culturas Populares da Secretaria de Cidadania e Diversidade Cultural (SCDC) do Ministério da Cultura (MinC), Tião Soares, destaca o papel do bailado. “As quadrilhas juninas são importantes manifestações das culturas populares e tradicionais do Brasil. Elas representam alta relevância de nosso patrimônio cultural nacional, pois resgatam tradições, reconhecem, valorizam e fortalecem identidades regionais, nacionais e promovem a inclusão social através da participação coletiva, característica peculiar das festas populares do Brasil”.
Origens
Sem fugir das origens, mas com recortes históricos que a enriqueceu, a quadrilha junina desembarcou no país com a corte portuguesa, no começo do século 19. Tem origem no quadrille, dança de salão composta por quatro casais, nascida na Paris do século 18 e pertencente a integrantes da elite. No Brasil, tornou-se popular junto aos aristocratas, mas logo conquistou a população e passou a incluir elementos culturais, religiosos e folclóricos nacionais.
Durante o movimento de popularidade, o número de pares cresceu. Além disso, os passos e ritmos franceses foram postos de lado. Desde então, as quadrilhas adquiriram importância social, econômica e turística para vários municípios, sobretudo no Nordeste.