Nesta segunda-feira (9), o Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou o interrogatório de oito réus acusados de integrar o grupo responsável pela tentativa de golpe de Estado para que Jair Bolsonaro (PL) pudesse permanecer no poder após derrota nas eleições de 2022.
O primeiro a depor foi Mauro Cid, o delator no processo. Ele firmou um acordo de delação premiada, que é quando um réu decide colaborar com as autoridades em troca de uma punição menor. Cid foi seguido pelo ex-diretor da Abin, Alexandre Ramagem.
Os demais réus vão ser questionados seguindo ordem alfabética: Almir Garnier (ex-chefe da Marinha), Anderson Torres (ex-ministro da Justiça), Augusto Heleno (ex-ministro do GSI), Jair Bolsonaro, Paulo Sérgio Nogueira (ex-ministro da Defesa) e Walter Braga Netto (ex-ministro da Casa Civil e da Defesa).
O presidente Jair Bolsonaro (PL) é o sexto da lista e deve depor entre quarta (11) e quinta (12), data de encerramento dos depoimentos.
Cid frustrado com linha investigativa da PF
Durante seu depoimento no STF, Cid disse ter se sentido frustrado diante das interpretações da Polícia Federal sobre as declarações que ele dava para a colaboração premiada.
Segundo Mauro, ele tinha um entendimento diferente dos investigadores sobre os fatos que narrava na delação que deu base à denúncia sobre a trama golpista de 2022. “Eles tinham uma linha investigativa e eu tinha outra visão dos fatos. E houve uma frustração do que eu estava contando não estar na linha investigatória da PF”, disse.
General disse que Exército cumpriria golpe se houvesse decreto
O tenente-coronel Mauro ainda afirmou que o general Estevam Theophilo, ex-chefe do Comando de Operações Terrestres, afirmou a ele que o Exército iria cumprir uma ordem golpista de Jair Bolsonaro (PL) caso o ex-presidente assinasse um decreto com as determinações.
Essa é a primeira vez que Cid diz que conversou diretamente com Theophilo sobre a trama golpista. O general é réu no Supremo por suposto apoio à tentativa de golpe de Estado.
Por mais que alguns generais do Alto Comando do Exército concordassem ou tivessem a ideia da maneira como foi conduzido o processo eleitoral, eles não fariam nada que quebrasse o elo de legalidade. Para alguma coisa ser feita, teria de ter uma ordem, e essa ordem teria de vir do presidente”, disse Cid.
O tenente-coronel afirmou que o general Theophilo – na época, membro do alto escalão do Exército – confirmou: “[Ele disse]: ‘Se o presidente assinar, o Exército vai cumprir’. Não que fosse ele quem ia cumprir, mas o Exército”.
Cid disse que obteve as informações do próprio Theophilo em um “bate-papo informal entre a entrada e a saída dele do Alvorada”. O tenente-coronel conta, porém, que não sabe o que foi tratado entre o general e o ex-presidente Jair Bolsonaro em 9 de dezembro de 2022.
Cid afirma que Bolsonaro enxugou minuta golpista
Ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro disse que o ex-presidente recebeu no fim de 2022 uma minuta de decreto que previa a prisão de autoridades, como ministros do Supremo e integrantes do Legislativo, e a criação de uma comissão para organizar novas eleições presidenciais.
Segundo o militar, Bolsonaro alterou o decreto algumas vezes. “Ele enxugou o documento, retirando as autoridades das prisões. Só o senhor ficaria preso”, disse Cid ao ministro Alexandre de Moraes.
“Os outros receberam um habeas corpus”, brincou Moraes. O próprio ex-presidente Bolsonaro riu da piada do ministro, sentado em cadeira no centro do tribunal.
Bolsonaro diz que Cid poderia ter dito ‘não’
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) afirmou nesta segunda-feira (9) que seu ex-ajudante de ordens Mauro Cid não teve uma experiência anterior no Poder Legislativo e que, por isso, teria facilidade para falar não a pedidos e conversas que chegassem a ele.
A declaração foi dada a jornalistas no plenário da Primeira Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) no intervalo da primeira sessão de interrogatórios dos réus do núcleo central da trama golpista de 2022. O primeiro a responder às perguntas é o tenente-coronel Mauro Cid, por ser colaborador da investigação.
“Vocês viram. Só tem um colaborador. Só um. Eu nunca disse não para alguém que me procurou. Como ele não teve essa vida pregressa legislativa, podia dizer não”, disse Bolsonaro.
É o primeiro encontro de Bolsonaro com o tenente-coronel Mauro Cid desde que o militar fechou um acordo de delação premiada com a Polícia Federal.
Ramagem diz que arquivos com ataques às urnas em seu computador eram anotações privadas
O ex-diretor da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) Alexandre Ramagem, por sua vez, afirmou em oitiva ao STF que documentos encontrados em seu computador com ataques às urnas eletrônicas eram anotações privadas e nunca foram enviadas a qualquer pessoa.
O deputado federal, segundo na lista de interrogatórios do núcleo central da trama golpista, disse fazer anotações para “concatenar as ideias” e conversar em outros momentos que o tema estivesse em debate.
“Esses são documentos pessoais, são documentos privados. Não houve difusão qualquer, encaminhamento qualquer desse documento. Era algo privado, com opiniões privadas minhas. Todas as questões que eram anotações privadas diversas, todas essas anotações da urna eletrônica, mas sempre foi, em todas elas, concernente à discussão que estava tendo, no mesmo período, no Congresso Nacional.”
Com informações de Ana Pompeu e Cézar Feitoza, da Folhapress