Desde a pandemia da Covid-19, têm se tornado cada vez mais frequentes nos cartórios de notas do Brasil registros de diretivas antecipadas de vontade (DAVs) feitas por pessoas que desejam proteger sua imagem e voz, diante do avanço da inteligência artificial (IA).
Os tabelionatos já registraram cerca de 5 mil DAVs em todo o país nos últimos três anos. A informação é da vice-presidente do Colégio Notarial do Brasil seção Rio de Janeiro, Edyanne de Moura Frota Cordeiro, tabeliã titular do 7º Ofício de Notas, em entrevista à Agência Brasil,
No estado do Rio de Janeiro, foram 107 escrituras sobre direitos digitais, sendo 31 somente no primeiro semestre deste ano. O maior número de registros se concentra nas regiões Sudeste e Sul, informou.
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O assunto ganhou evidência recentemente após a aparição da cantora Elis Regina em um comercial da Volkswagen, cuja imagem foi reconstituída a partir de inteligência artificial. Elis Regina morreu em 1982.
Situação mais ou menos parecida ocorre com a voz da cantora Marília Mendonça, morta num acidente de avião em 2021. Diversas músicas lançadas por outros cantores costumam ganhar outra versão com a voz de Marília, através da IA.
A tabeliã lembrou que, em paralelo ao desenvolvimento da mídia e ao aparecimento de influencers em plataformas digitais, a IA vem sendo cada vez mais aprimorada “e, hoje em dia, se pode fazer várias coisas com a voz da pessoa e imagem, mesmo pós-mortem”. Por isso, ela destacou a necessidade de se regular as relações jurídicas.
Proposta de lei
O projeto de lei 3.592/2023, de autoria do senador Rodrigo Cunha (Podemos/AL), busca disciplinar e estabelecer regras para a utilização das imagens e recursos digitais, principalmente no caso de pessoas já falecidas. “Porque a pessoa viva ainda tem como se defender”, advertiu a vice-presidente do CNB/RJ.
De acordo com o PL, o uso da imagem de uma pessoa falecida por meio de inteligência artificial só será permitido com o consentimento prévio e expresso da pessoa em vida ou dos familiares mais próximos.
A proposta ainda determina que a permissão deve ser obtida e apresentada de forma clara, inequívoca e devidamente documentada, especificando os objetivos a serem alcançados com o uso de imagens e áudios.
Regulamentação
Em entrevista à Revista Marie Claire em agosto último, a ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), defendeu que a inteligência artificial precisa passar por uma regulamentação.
“Claro que precisa de regulamentação. Como vejo isso: no discurso final do Charles Chaplin em 1926, no Tempos Modernos, ele diz: “Não vamos deixar as máquinas dominarem, não vamos deixar que tomem a nossa humanidade”. Para mim, é o mesmo alerta hoje. As máquinas são criações do ser humano para melhorar a sua vida. Não podemos nos deixar converter em criaturas dessas criações, que não têm alma, não têm o sentido de humanidade”, afirmou a magistrada.
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Colaborou Agência Brasil